sábado, 28 de abril de 2012

Dúvidas sobre saúde de Chávez esquentam debate eleitoral na Venezuela


A projeção de um cenário eleitoral na Venezuela sem a presença do presidente Hugo Chávez - em tratamento para combater um câncer na zona pélvica - é foco de polêmica no país a seis meses das eleições presidenciais.

Em uma reunião fechada com membros do partido governista PSUV, o governador do Estado de Portuguesa, Wilmar Castro Soteldo - designado por Chávez como coordenador de Medição e Avaliação do comando de campanha - disse que há três cenários possíveis para o pleito presidencial de outubro, entre eles a possível ausência de Chávez como candidato.

Essa foi a primeira vez que um membro do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) admitiu, ao menos publicamente, que Chávez poderia não ser o candidato chavista que disputaria as eleições contra o candidato de centro-direita Henrique Capriles Radonski, representante da coalizão opositora.

"Chávez tem câncer e qualquer conflito pode desatar três cenários: Chávez debilitado, sem Chávez ou sem eleições", afirmou Castro Soteldo, de acordo com a imprensa local.

Suspensão do pleito

A hipótese de suspensão das eleições foi mencionada, segundo ele, em um contexto de suposto "conflito" gerado pela oposição. O "caos", disse, poderia levar à suspensão do pleito eleitoral. Essa hipótese de "crise social" provocada pela oposição antes das eleições é reiterada por diferentes membros do governo.

Representantes da coalizão opositora rejeitaram as acusações e convocaram o PSUV a respeitar a data das eleições. "Não podemos depender da possibilidade de o presidente ser ou não candidato (...) as eleições serão em 7 de outubro com ou sem Hugo Chávez como candidato", afirmou deputado opositor Juan Carlos Caldera.

O debate sobre as eleições sem Chávez - que poderia ocorrer caso o estado de saúde do presidente piore - obrigou a cúpula do PSUV a dar explicações.

A chefe de governo de Caracas, Jacqueline Faría, disse que as declarações de Soteldo foram mal-interpretadas e negou que o PSUV esteja costurando uma candidatura alternativa à de Chávez. O único plano é um "contundente triunfo (com Chávez)" nas eleições de outubro, disse Faria em um ato público.

O chefe do comando de campanha eleitoral, Jorge Rodríguez, disse que não há "plano B" e que o "candidato da revolução" é Chávez.

Jacqueline Faría, admitiu, no entanto, que Chávez terá uma participação limitada na campanha, devido ao tratamento contra o câncer. "Certamente ele (Chávez) não andará de caminhão em caminhão, como fez em outras oportunidades, mas para isso tem toda sua equipe", afirmou.

Panorama eleitoral

Na visão do especialista em opinião pública Ivan Abreu, da Universidade Central da Venezuela, uma candidatura chavista alternativa a Chávez altera todo o panorama eleitoral. A seu ver, apesar do desgaste de 13 anos no poder e do estilo personalista, "Chávez é o único líder do chamado processo revolucionário e é o candidato com maior carisma e captação", afirmou.

"Capriles Radonski é visto como um candidato mais ''gerencial'', mas não como um líder que arrasta massas" observou.

A última pesquisa de intenção de voto realizada pela consultoria Hinterlaces aponta que 53% dos eleitores votariam em Chávez e 34% em Capriles Radonski. A mesma pesquisa mostra que 74% dos venezuelanos acreditam que Chávez se curará do câncer.

Se Chávez ficasse fora da disputa, a oposição tenderia a incrementar suas possibilidades na disputa. Porém, não representa uma vitória "automática" anti-chavista, adverte o analista político Carlos Romero, da Universidade Central da Venezuela.

"Se o candidato não for Chávez a diferença cai, mas isso não significa que a oposição sairá vitoriosa automaticamente"; afirmou Romero à BBC Brasil.

Sucessão

A disputa pelo poder entre as diferentes correntes chavistas - que navega entre a direita e a esquerda - deverá ser definida pelo próprio Chávez. Se estiver impedido de assumir a candidatura presidencial - hipótese negada pelo próprio mandatário, que reitera a cada aparição pública sua candidatura - ele terá de escolher um sucessor.

Desde a primeira cirurgia para extração do tumor cancerígeno, comenta-se que o ministro de Relações Exteriores, Nicolás Maduro, poderia ser nomeado vice-presidente, substituindo o atual vice Elías Jaua, considerado como o representante do núcleo de esquerda dentro do governo. Esse seria um primeiro indício de mudanças na Cúpula do governo desde que Chávez adoeceu.

Outra possibilidade seria a construção de uma espécie de junta de governo, liderada pelos principais aliados do presidente, lista que incluiria Maduro, Jaua, o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello - representante do setor militar -, Rafael Ramírez, ministro de Energia, e Adán Chávez, irmão do mandatário.

Uma fonte de alto escalão militar disse à BBC Brasil que as Forças Armadas "ainda não veem" quem poderia substituir a Chávez. "Respeitaremos e apoiaremos a decisão do comandante, mas por enquanto, ninguém tem apoio real", afirmou.

Na avaliação do especialista em opinião pública Iván Abreu, da Universidade Central da Venezuela, a falta de informação mantém a sociedade em um estado de "incerteza" e "temor". "O melhor a fazer em um cenário como esse é dizer a verdade", afirmou. "O benefício do governo é transitório, porque quem mais se beneficia são os que pretendem se posicionar ou influenciar a sociedade de uma ou outra maneira", acrescentou.

A reaparição pública do mandatário de 57 anos é aguardada com expectativa. Ele voltou de Havana na madrugada da quinta-feira, onde ficou 11 dias em tratamento com radioterapia. Desde então não foi visto mais publicamente.

Na quinta-feira, em uma breve conversa com o vice-presidente Elías Jaua, por telefone, Chávez disse que está em curso uma "operação de guerra psicológica" contra sua candidatura.

"Devemos seguir em frente com fé e fortalecer o nosso compromisso com a revolução", disse, durante um ato de nomeação dos representantes do comando de campanha transmitido pelo canal estatal. "Unidade, unidade, unidade (...) a batalha será dura, mas triunfaremos", disse.

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